O escritor

Lucas sentou-se na escrivaninha. Não tinha a menor idéia do que ia fazer, só sabia que ia fazer, desde os oito era seu grande sonho, talvez pela necessidade de terror despertada nele por Edgar Alan Paul, talvez pela irreverente perspicácia na criação dos personagens e seus pensamentos de Stephen King, ou talvez pela genial simplicidade das histórias de suspense de Agatha Christie. Não importava, esse era seu grande sonho, e ia começar dentro em breve, quando descobrisse o que ia fazer.

Tentou pensar em tudo o que lhe acontecera ao longo do dia. De fato, Não tinha sido nada agradável aquele dia. Maicão estivera mais valentão do que nunca, encafifou que alguém roubara sua lancheira, esse alguém merecia uma surra.
           
Olhou seu braço roxo, ainda doía um pouco, mais estava acostumado. Essa ele tiraria de letra. Tentou afastar esses pensamentos, pensar em algo melhor, mais alegre, e pensou.
           
Pensou nos olhos mais azuis que o mundo já vira, no vestidinho vermelho com alça de nilon e o desenho do Mickey bem pequeno no canto, no perfume doce que ele inalava toda vez que ficava a três metros dela e no simples All Star jeans, o único pro qual olhava quando ficava perto dela, já que não conseguia olhar para frente. “Um dia perco o medo e falo com ela”- pensou – “Esquece" - sempre chegava á essa conclusão.
           
Distanciou-se de novo dos pensamentos, “Preciso me apressar, se quero ser um escritor, tenho que começar agora, pense só em um personagem, unzinho só”. Mas não conseguia criar nada em sua cabeça cansada.
           
Quando se deu conta, estava debruçado em seus próprios braços, os quais seguravam de leve enquanto dormia um pequeno pedaço de papel, o início do que seria seu livro, que trazia uma única frase: “A maior riqueza do homem está em seu erro, quanto menos um homem erra menos homem é”. Acordando de um breve cochilo.
           
De súbito, amassou o papel, ponderando se teria realmente escrito aquilo, se direcionou até a porta quase que espontaneamente. Saiu. Nunca estivera tão decidido do que ia fazer. Foi tão rápido que não percebeu que a caneta que segurava antes de cochilar não era a mesma que ele colocara na escrivaninha antes de sair.
           
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Dona Amélia, esperando aflita pela saída de seu filho porta afora, entrou de fininho no quarto com um leve sorriso de satisfação misturada à alegria de saber que seu filho estava crescendo. Pegou sua caneta de volta e voltou para seu crochê na sala, pensando se um dia receberia um livro autografado por Lucas ao melhor estilo suspense e se iria vê-lo passar por aquela porta sorridente hoje, com o sorriso de um garoto apaixonado.

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