Bom, antes de
qualquer coisa é preciso deixar claro que este texto falará sobre o que eu
considero ser uma das melhores obras de Ang Lee, o filme de 2012 intitulado “As
aventuras de Pi”.
Já assisti esse filme algumas vezes e como
um cinéfilo e ateu assumido que sou, fiz uma reflexão sobre a mensagem que a
película passa e resolvi escrever esse texto para juntar um pouco as coisas.
Para aqueles que estão lendo isso,
recomendo que tenham assistido o filme, mais do que isso, tenham o entendido.
Assim, vai ficar mais fácil entender o meu ponto de vista.
Mas, de qualquer maneira, fiz o texto de
forma bem didática para aqueles que ainda não o assistiram. Portanto, se você
ainda não assistiu e interessa-lo ler as próximas linhas, vá em frente!
Com o nome original de “Life of Pi” o
diretor de “O segredo de Brokeback Montain” e “O tigre e o Dragão” cria uma
obra excelente cuja produção enche os olhos do espectador e o roteiro (de igual
excelência) tenta ao meu ver converter as pessoas a crença de um ser maior que
rege o mundo e olha por todos: Deus (qualquer que seja esse Deus).
Nesse ponto do texto, aqueles que me
conhecem e sabem que sou ateu percebem a contradição acima e questionam: Mas,
se você é ateu, como pode gostar de um filme que, pode-se dizer, tem o objetivo
de converter as pessoas à crença de um Deus?
Por isso o titulo do texto. Explicarei.
Primeiro, para aqueles que não assistiram
a obra (que perdeu injustamente em minha opinião o Oscar para “Argo”, que não é
fraco, mas inferior a essa produção), devo contar-lhes um pouco da história.
Então lá vai...
Spoiler abaixo
(sim, é necessário):
O filme conta a história de Piscine Patel (apelidado de “Pi”) um garoto que sobrevive a um naufrágio envolvendo sua
família em um navio cargueiro com animais de varias espécies. Ele fica sozinho
por vários dias com alguns desses animais (uma zebra, um orangotango, uma hiena
e Richard Perker, um tigre de bengala adulto) em uma pequena jangada no meio do
oceano.
Até aí tudo bem, o que torna o filme mais
do que só isso é o roteiro (que também perdeu o Oscar), a fotografia de Claudio
Miranda (essa ganhou!) e o final surpreendente.
No começo do filme, o personagem principal
da historia, já adulto, recebe um jornalista em sua casa, para o qual contará
toda a história.
O jornalista está lá, pois pretende,
claro, escrever sobre a história e, em uns dos primeiro diálogos, esse
jornalista diz que ouviu falar que Piscine tem uma história que o fará começar
a acreditar em Deus, e aí começa a ouvir a história.
Com produção mágica e cenas que fazem quem
viu o filme em 3D achar George Lucas um bosta (ok, tentativa de piada exagerada
aqui...rs), o cara vai contando toda a sua jornada que envolve, além do tigre
citado, o orangotango boiando em um cacho de bananas, uma ilha carnívora cheia
de suricatos (rápido, que a hiena já vem!) entre outras coisas. A aventura
termina com um resgate dele e o feroz tigre numa praia no meio do nada. Mas o
filme ainda não terminou.
No hospital, se recuperando da tragédia,
nosso garoto recebe caras da seguradora do navio que também querem uma
história, mas é claro que eles querem uma história que envolva menos
alucinógenos que a contada. E então, para satisfazer esses caras, o garoto
inventa outra história. Na curta cena em que ele conta essa história, o roteiro
revira todo o filme e você acaba percebendo algo surpreendente: O garoto estava
imaginando tudo o tempo todo, os animais na jangada são alegorias dessa
imaginação, a hiena é o cozinheiro do navio que mata o orangotango (que é sua
mãe!) e Richard Parker é o lado mau do próprio Pscine, desperto pelo
assassinato de sua mãe.
Legal seria adentrar as metáforas todas
que o filme traz neste ponto, mas para os fins deste texto, bastam as citadas
acima.
Bem, ao final do filme então, temos duas
histórias: a espetacular e cheia de efeitos que envolvem um tigre de bengala e
uma ilha carnívora. E a triste e trágica contada no final para os caras da
seguradora, sobre um menino que fica preso em alto mar lutando para sobreviver
e em uma batalha psicológica consigo mesmo após ter matado o assassino de sua
mãe.
A religião volta ao filme com a pergunta
final de Piscine, o contador das duas histórias ao jornalista:
"Qual é a melhor história em sua
opinião?"
"A do tigre" – responde o
escritor.
"Com Deus também funciona
assim!" – Diz Piscine em uma frase que poderia por fim ao filme sem
acrescentar mais nada.
Certo, com a história do filme contada,
vamos as minhas considerações sobre o filme, "ateísticamente" falando.
Como tinha falado, o filme é uma das
coisas mais belas que tive o prazer de ver em minha curta vida como um cinéfilo
assumido.
Ang Lee claramente tenta com ele alavancar
uma conversão das pessoas céticas (como eu) em uma crença em algo maior, um
Deus.
Só que como cético ateu que sou, ficaria
com a segunda história. Por quê?
Porque como cético ateu, eu utilizo a
minha linha de pensamentos para chegar à conclusão que é mais provável que ele
tenha matado o cozinheiro e inventado toda a história do tigre do que um
orangotango conseguir chegar ao barco boiando em bananas ou uma ilha cujo solo
é carnívoro, cheia de suricatos, existir!
Ponto.
Veja bem, não estou dizendo que a história
que o jornalista escolheu (Deus) é impossível. Estou dizendo que é improvável,
ou pelo menos, menos provável que a história que eu escolheria (a de que o
garoto ficou louco por um naufrágio matar toda a sua família e um cozinheiro de
merda assassinar sua mãe na sua frente).
Como ateu, prefiro a segunda história, mas
não posso provar (e ninguém pode) que a primeira história não tenha sido real.
Há quem prefira a primeira história,
ache-a mais bela e de um sentido melhor à vida. Nada contra, cada um acredita
no que quiser. O erro está em levar a história 1 tão a serio a ponto de achar
que quem prefere a 2 está errado, e vice-versa.
Esse é o ponto em que queria chegar, o
roteiro, efeitos visuais, fotografia e história do filme de Ang Lee são
excelentes. Nem Deus (não, droga, ele não existe...kkk) pode negar isso!
Para mim, o diretor conta duas histórias
no filme e dá a entender que, para ele, a maior delas (a que toma 99% do filme)
é a melhor para todos acreditarem. Eu discordo, prefiro a visão mais racional
das coisas. Questão de opinião, cada um tem a sua. Ang Lee expôs seu ponto de
vista em ”As aventuras de Pi” e eu expus o meu aqui.
PS: É interessante notar que não há
distinção de religião no filme. Aliás, há varias referencias a religiões
diferentes (o próprio Patel acredita em Alá).
A experiência de ver o filme nos traz algo
único, pois existem infinitas maneiras de interpretar a mensagem. O filme
é lindo por fora e cada um de nós que olhar para ele, encontrará uma
maneira de achá-lo bonito por dentro também.
Nenhum comentário:
Postar um comentário